SINDIQUÍMICA
Em conversa com chefe de facção, ex-secretário do RJ admite celular em presídios
Por ‘trégua’, Raphael Montenegro afirmou que respeita Marcinho VP e que criminoso é ‘mais importante que o secretário de Segurança do Rio’
Preso nesta terça-feira (17) pela Polícia Federal, o agora ex-secretário de Administração Penitenciária do Rio de Janeiro Raphael Montenegro admitiu, em conversa com líderes da facção criminosa Comando Vermelho (CV), que o governo não consegue conter a entrada de telefones celulares nos presídios.
Os diálogos ocorreram em maio deste ano no presídio federal de Catanduvas, no Paraná, e foram registrados pelos investigadores com autorização da Justiça Federal. As informações constam na denúncia do Ministério Público Federal, à qual a CNN teve acesso.
Em meio a elogios, Montenegro fez apelos aos criminosos para tentar um acordo para “baixar a poeira” no estado — em outras palavras, segundo os investigadores, seria uma trégua para reduzir alguns crimes praticados pela facção, em troca do retorno dos traficantes para o Rio de Janeiro.
O ex-secretário, que chegou a pedir “espírito cooperativo” aos criminosos, foi gravado pelas autoridades, com autorização judicial, conversando com cinco traficantes que, de acordo com a investigação, fazem parte da cúpula da facção criminosa.
“Você é um cara que talvez seja mais importante que o secretário de Segurança Pública no Rio”, diz trecho do diálogo de Raphael Montenegro com Marcio dos Santos Nepomuceno, o Marcinho VP, preso há 25 anos e apontado como a principal liderança do CV ainda hoje.
A Secretaria de Segurança do Rio de Janeiro, mencionada no diálogo do ex-secretário com Marcinho VP, deixou de existir quando o ex-governador Wilson Witzel assumiu o cargo, em janeiro de 2019, mas foi durante décadas o posto mais importante da gestão da segurança no estado por colocar, sob sua estrutura, a gestão das polícias Civil e Militar.
Elogio a líderes criminosos
Ao longo de 56 páginas, o MPF descreve como o ex-secretário “enalteceu a condição de líderes” dos criminosos do Comando Vermelho. De acordo com os procuradores, Montenegro atuou para ajudar criminosos a “recuperar o status perdido com a ida deles para Catanduvas e ajudá-los a reassumir os negócios escusos envolvendo tráfico de entorpecentes, contrabando e homicídios”.
Em conversa com Marcinho VP, segundo consta na denúncia, o ex-secretário resumiu sua ideia.
“A gente sabe que o Comando, você é o ‘frente’ do Comando (CV), ninguém tem expectativa que você vá pro Rio pra largar a vida, a gente sabe, a gente tem consciência dos compromissos que você tem com os seus irmãos, a gente tem consciência do compromisso que você tem com a facção. Agora, a gente também sabe que você é um cara que no Rio, pô, pode baixar a poeira, né, afirmou.
“Verdade”, admite Marcinho.
Depois, Montenegro ainda faz elogios à capacidade do criminoso de manter influência sobre o CV mesmo após tanto tempo preso — reafirmando que o respeita.
“Quinze anos aqui e você ainda fala pela facção, é mérito! E a gente respeita isso, como respeita não só o Marcio homem, mas o Marcinho VP. O Marcinho VP, o traficante, esse cara tem que ser respeitado, a gente respeita por tudo que você construiu. Agora, a gente quer que o Marcio, como homem volte, e volte num espírito cooperativo.”
Ex-secretário preso
O ex-secretário de administração penitenciária Raphael Montenegro foi preso com outros dois integrantes da secretaria. As investigações mostram indícios de acordo com facção criminosa para capital político e possíveis vantagens indevidas.
Ele é advogado e atuou na campanha de Wilson Witzel ao governo, tendo ocupado os cargos de chefe de gabinete do Executivo fluminense e subsecretário da Casa Civil.
Em nota, o governo do Rio de Janeiro “se comprometeu a auxiliar no aprofundamento das apurações”.
A CNN tenta localizar as defesas de Raphael Montenegro e dos outros dois presos na operação de hoje.
Fonte: CNN