SINDIQUÍMICA

BC mantém a taxa de juros, mas sinaliza que alta está mais próxima

Com a inflação mais elevada, Copom abandona a indicação de que a taxa básica seria mantida nas próximas reuniões. Início de novo ciclo de subida da Selic, porém, não está definido. Colegiado volta a apontar risco de agravamento do rombo nas contas públicas

O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) decidiu, ontem, por unanimidade, manter a taxa básica de juros (Selic) em 2% ao ano. Foi a 4ª reunião seguida em que o órgão optou por continuar com a Selic no menor patamar da história. A decisão do colegiado, que se reuniu pela primeira vez no ano, era esperada pelo mercado. A novidade do comunicado divulgado pelo BC após o encontro foi a retirada do forward guidance — instrumento de política monetária usado para sinalizar a manutenção dos juros por um período prolongado.

O comitê explicou que as expectativas de inflação,inclusive em seu cenário básico, “estão suficientemente próximas da meta para o horizonte relevante de política monetária”. “Como consequência, o forward guidance deixa de existir e a condução da política monetária seguirá, doravante, a análise usual do balanço de riscos para a inflação prospectiva”, destacou o comunicado.
O documento reforçou que o fim do forward guidance não implica, mecanicamente, em elevação da taxa de juros. “A conjuntura econômica continua a prescrever, neste momento, estímulo extraordinariamente elevado frente às incertezas quanto à evolução da atividade”, observou.

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O Copom elevou as projeções para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de 3,5% para 3,6%, no cenário básico, com o dólar a R$ 5,35, acima dos R$ 5,25 previstos na última reunião, em 8 e 9 de dezembro. A meta de inflação estipulada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) para 2021 é de 3,75%, com piso de 2,25% e teto de 5%. Para 2022 e 2023, as projeções do BC para o IPCA ficaram em 3,5% e 3,25%, respectivamente.

O comunicado também destacou a ociosidade elevada da economia como fator para que as pressões inflacionárias não aumentem, mas advertiu que os riscos fiscais continuam elevados, “criando assimetria altista no balanço de riscos”. “Um prolongamento das políticas fiscais de resposta à pandemia que piore a trajetória fiscal do país, ou frustrações em relação à continuidade das reformas, podem elevar os prêmios de risco”, alertou.

Especialistas disseram que não houve muita surpresa no comunicado, mas divergiram sobre quando o BC deverá iniciar o novo ciclo de alta da Selic. Na avaliação do economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, “o Copom não deu uma sinalização, por enquanto, de quando vai aumentar os juros, mas reconheceu, implicitamente, que vai precisar subir a Selic quando o modelo indicar que a inflação na meta, no ano que vem, só acontecerá com taxa mais elevada”, explicou. Ele manteve a previsão de taxa Selic encerrando o ano em 3,5% e estima que o Comitê deverá iniciar o novo ciclo de elevação dos juros em junho.

Roberto Padovani, economista-chefe do Banco BV, lembrou que as condições para a retirada do forward guidance eram a piora nas expectativas de inflação ou piora nos modelos de projeção do BC, e a mudança no regime fiscal.

Quadro grave

“O que aconteceu foi que houve piora nas expectativas de inflação e de mudança, provavelmente para pior, nos modelos de projeção do BC. Como as condições para a retirada do forward guidance foram satisfeitas, eles estão retirando o compromisso de ficar com os juros parados por muito tempo. Mas, também, sinalizaram que não devem mexer automaticamente na taxa. Será preciso um quadro mais grave de inflação acima da meta neste ano para eles começarem a subir os juros imediatamente”, disse. Padovani aposta em alta na Selic a partir de agosto e prevê a taxa básica encerrando o ano em 3%, com o dólar a R$ 5.

Para Eduardo Velho, economista-chefe da gestora JF Trust, o Copom deverá iniciar o novo ciclo de alta da Selic em abril, a taxa básica deverá encerrar 2021 em 3,2%, e só alcançará 4% ao ano na primeira metade de 2022. “A expectativa é de que o BC deve elevar os juros gradativamente, e essa sinalização é positiva, porque o mercado estava muito pessimista. Algumas projeções para a Selic estavam entre 4% e 5% para o fim do ano”, afirmou.A Confederação Nacional da Indústria (CNI) considerou acertada a decisão do Copom. “O ano de 2021 será desafiador, e a manutenção da taxa Selic em baixo patamar possibilita uma recuperação mais célere da atividade econômica e do emprego, uma vez que incentiva a demanda, ao manter melhores condições de crédito para empresas e consumidores”, disse o presidente da entidade, Robson Andrade, em comunicado divulgado logo após o término da reunião do Copom.

País ainda lidera ranking de taxas altas

Apesar de a taxa básica da economia (Selic) permanecer no menor patamar da história, de 2% ao ano, o Brasil ainda figura no ranking das 10 maiores taxas de juros do mundo, sejam nominais, sejam reais (descontada a inflação).
Conforme levantamento feito pela Infinity Asset Management, o Brasil ficou em 8º lugar no ranking de 40 países, com taxa de juro real de -0,19% ao ano. O dado é elaborado considerando a taxa Selic projetada para os próximos 12 meses, descontando a inflação estimada para o mesmo período, que consta no boletim Focus, do Banco Central, de 4,3% ao ano, de acordo com o economista-chefe da Infinity, Jason Vieira.

Argentina na lanterna
A taxa média ficou -1,28% na lista, com a Turquia na liderança, com juros reais de 2,44%. A Indonésia, em segundo lugar, com juros reais de 1,56% ao ano, foi acompanhada, na sequência, por Rússia, China e México com taxas anuais de 1,18%, 0,88% e 0,68%, respectivamente. A Argentina, com a menor taxa de juros real, de -11,64%, ficou na lanterna.
Já no ranking de juros nominais elaborado pela Infinity, o Brasil ficou em 10º lugar entre os 40 países listados. Na liderança, a Argentina, com taxa básica de 38% ao ano, é seguida pela Turquia, com juros nominais de 17% ao ano. Índia, China, México e Rússia vieram na sequência, com taxas anuais de 6,40%, 4,35%, 4,25% e 4,25%, respectivamente.
Na avaliação de Vieira, a decisão do Copom, de manter a Selic e retirar o instrumento que sinalizava a manutenção dos juros por um período mais prolongado “foi em linha com o esperado”. Ele prevê alta da Selic a partir de março, com os juros básicos encerrando 2021 em 4% ao ano.(RH)

Congresso avalia prorrogar auxílio

Apesar de o presidente Jair Bolsonaro dizer que “o governo não aguenta estender o auxílio emergencial”, a possibilidade de que o benefício seja renovado ganha força em Brasília, inclusive entre aliados do Palácio do Planalto. A ideia é usar a votação do Orçamento de 2021 para tentar liberar algum recurso para o programa, dentro da regra do teto de gastos.
A prorrogação do auxílio emergencial, que vinha ajudando 68 milhões de brasileiros na pandemia de covid-19, mas chegou ao fim em 31 de dezembro, é defendida por boa parte do Congresso Nacional. A percepção é de que o benefício continua sendo necessário, já que os casos do novo coronavírus voltaram a subir, fazendo com que algumas cidades endureçam as medidas de isolamento social neste momento em que o desemprego ainda é grande no país. Segundo aliados do Palácio do Planalto, a medida tem a “boa vontade” de Bolsonaro, mas esbarra no impasse fiscal que provocou o fim do programa.
O auxílio emergencial custou R$ 293 bilhões em 2020, o que elevou o endividamento público. Com o fim do Orçamento de Guerra e 93,7% da proposta orçamentária de 2021 comprometidos por despesas obrigatórias, Bolsonaro tem reforçado o discurso da equipe econômica de que não há espaço para manter o benefício. Em conversa reservada com aliados, contudo, o presidente indicou que, se tivesse espaço fiscal, poderia renovar o auxílio.
Parlamentares se preparam para levantar o assunto à votação do Orçamento, que deve ocorrer logo após a eleição dos próximos presidentes da Câmara e do Senado. Até o deputado Arthur Lira (PP-AL), candidato do Planalto na eleição da Câmara, já admitiu que o governo poderia pagar mais duas ou três parcelas do benefício se fosse possível encaixar o programa na proposta orçamentária, sem furar o teto de gastos.
Aliados do Planalto questionam se não seria possível pagar o auxílio com a verba que foi poupada no ano passado por conta da paralisação de alguns serviços públicos, como as aulas presenciais — segundo o último Resultado do Tesouro Nacional, havia R$ 34,8 bilhões empoçados nos órgãos públicos em novembro de 2020.
Fontes da equipe econômica dizem que, para o ministro Paulo Guedes, a renovação do auxílio emergencial só deveria entrar na pauta caso as cidades brasileiras recuassem para o mesmo nível de isolamento social do início da crise de covid-19. No ministério, a ideia é usar a discussão orçamentária para analisar o que é possível cortar de forma permanente no Orçamento, de forma a liberar um espaço fiscal definitivo que permita a criação de um programa social como o Renda Brasil ou a ampliação do Bolsa Família.
A proposta em análise é incluir 300 mil famílias e elevar de R$ 190 para R$ 200 o benefício do Bolsa Família, além de incentivar a inserção dos mais vulneráveis no mercado de trabalho, com os recursos que tem disponíveis no Orçamento para o programa.

Fonte: Correio Braziliense