SINDIQUÍMICA
Tabelamento de juros e suspensão de pagamentos de empréstimos trazem riscos
Projetos como tabelamento de juros e suspensão de pagamentos de empréstimos podem acarretar mais problemas que soluções
Há mais de três meses, o país decretou estado de calamidade pública, com a invasão do novo coronavírus. O governo precisou abrir os cofres para tentar reduzir os prejuízos na economia e os bancos entraram no circuito como ponte entre os recursos e a população, seja por meio de empréstimos e financiamentos, seja pela operacionalização de repasses de benefícios. Mas, por maiores que sejam os esforços, pessoas e empresas vão sair endividadas da pandemia, o que pressionará, ainda mais, o sistema financeiro.
Por isso, em meio à contenção de danos, também é preciso evitar que a situação econômica, social e sanitária seja usada como motivo para medidas que possam resultar em uma crise bancária, alerta o presidente da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Isaac Sidney Ferreira. Ele afirmou que uma atuação intervencionista nos bancos seria desastrosa para a economia e para a imagem do país. “Uma crise não deve gerar
outra”, defende o presidente da Febraban.Medidas que pressionem ainda mais as instituições, segundo ele, teriam consequências inevitáveis “na retomada da atividade, na confiança das pessoas, na credibilidade da economia”. Ex-diretor do Banco Central, Ferreira ressalta a importância de evitar o máximo possível que uma “visão simplista” do setor resulte em problemas graves, que atingiriam toda a população. “Já aprendemos o quanto desastroso seria uma nova crise e a retomada da economia seria bem mais complicada.
Travessia difícil
Ferreira ressalta que a crise “ainda é muito profunda e severa”, apesar de o pior momento, na opinião dele, já ter passado. A demanda por crédito permanece disfuncional, as empresas estão quebrando, milhões de postos de trabalho continuam sendo destruídos e o país ainda não chegou ao pico do desemprego. A inadimplência, portanto, deve crescer. “É muito importante que os bancos continuem saudáveis e sólidos nessa difícil travessia”, ressalta.Por isso, para o presidente da Febraban, é preciso acabar com a visão “fácil e cômoda, mas distorcida e errada”, de que os bancos são “insensíveis e alheios ao sofrimento de pessoas e empresários”, discurso que acaba motivando projetos como os citados. “Nesse cenário adverso, não precisamos reinventar a roda. Basta seguir o exemplo das principais economias. Ou seja, que o Estado assuma o risco de crédito, sobretudo das empresas e setores mais atingidos pela crise”, defende.
Apesar dos riscos apontados, Ferreira prevê uma retomada bem-sucedida da atividade econômica. “Virá em breve, não tenhamos dúvida”, acredita. A pior fase, na avaliação dele, foi entre abril e maio. Agora, os indicadores devem melhorar, e o sistema financeiro está preparado para o pós-pandemia. “Os bancos brasileiros estão sólidos e prontos para dar sustentação à fase de reativação da economia, para que ela seja o mais rápida possível, segura e consistente”, afirma.
Com a implementação do Plano Real, na década de 1990, vários bancos privados, que tinham as receitas beneficiadas pela inflação, quebraram. O governo teve de lançar um programa de socorro aos que sobreviveram. “Não podemos repetir erros passados”, reforça o presidente da Febraban. O problema é que alguns projetos em andamento no Congresso, no entender da instituição, podem fragilizar o sistema bancário, em vez de fortalecê-lo e prepará-lo para o pós-pandemia.
Distorções perigosas
Iniciativas que “promovem uma intervenção artificial na atividade econômica e interferem nos contratos” são as que mais preocupam os bancos privados. Há propostas em tramitação que sugerem, por exemplo, fixar um teto de 20% ao ano para taxas de juros do cheque especial e do cartão de crédito. Outros pretendem proibir que os bancos negativem clientes que deixaram de pagar os valores devidos, suspender o pagamento de parcelas do crédito consignado durante a pandemia e aumentar a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) das instituições de 20% para 50% — essa última proposta é vista como um confisco.
Ferreira lembra que os bancos já se submetem a normas rígidas de risco de crédito estabelecidas pelo Banco Central. “O recurso emprestado precisa voltar, ser devolvido aos depositantes e aos investidores”, afirma. Medidas do tipo, na visão dele, não têm eficácia, pelo contrário, “distorcem a formação de preços, criam gargalos e fazem com que o país dê marcha a ré”, enfatiza. “Podem agravar a crise”, acrescenta. A impressão dele é de que, ao propor as matérias, os parlamentares não consideraram os danos a longo prazo.
Além dos efeitos negativos diretos na economia, o presidente da Febraban destaca que mudanças como as sugeridas gerariam insegurança jurídica e prejudicariam a imagem do país, o ambiente de negócios e, consequentemente, o apetite por investimentos. “Às vezes, o alvo são os bancos, mas a vítima alvejada são os consumidores. Todos perdem”, diz. Segundo ele, se não fosse pela atuação do sistema financeiro, o país estaria enfrentando uma recessão ainda maior.
Fonte: Correio Braziliense