SINDIQUÍMICA

Auxílio de R$ 300, sugerido pelo governo para segunda onda de Covid, não deixará de empurrar milhares para extrema pobreza

O governo afirmou nesta quinta-feira (29) que, em caso de segunda onda de Covid, como tem ocorrido na Europa, pretende pagar um auxílio de R$ 300 apenas para os mais vulneráveis. Economistas afirmam que a medida não vai deixar de empurrar milhares de brasileiros para a extrema pobreza e ainda desagradar o mercado externo, resultando num aumento amais expressivo do dólar e maior elevação no preço dos alimentos.

Para Marcelo Neri, diretor do FGV Social e fundador do Centro de Políticas Sociais, o ano de 2021 será pior que o de 2020. Ele acredita que, caso seja necessário manter o isolamento social e fechar o comércio novamente, a recessão pode aumentar. E, se o governo mantiver os auxílios da mesma maneira que ocorreu este ano, por não ter recursos fiscais, o mercado internacional pode punir o país, fazendo a pobreza aumentar por outras questões.

— Estamos entre a cruz e a espada! Vamos sair do céu de brigadeiro que temos hoje, porque muitas pessoas saíram da extrema pobreza devido a esse benefício, e vamos direto ao inferno. De fato, temos uma situação bastante preocupante. Hoje estamos numa posição muito boa do ponto de vista social, mas que não seria sustentável do ponto de vista fiscal — analisa Neri.

Neri ainda observa que, ao contrário do que aconteceu na Austrália, onde os benefícios sociais neutralizaram os efeitos da pandemia, no Brasil, o auxílio fez mais que isso tirando cerca de 15 milhões de pessoas da pobreza. Porém, o valor gasto em nove meses será equivalente ao orçamento do bolsa-família para nove anos, o que inviabiliza a continuidade da operação.

— A renda média do bolsa-família é de R$ 190. Na pandemia, mães solteiras ganharam R$ 1.200. Nenhum país na América Latina teve tamanha generosidade, mas a nossa situação fiscal é a pior de todas! — opina o diretor do FGV Social: — Com o encerramento do auxílio, sendo otimista, 15 milhões de pessoas vão voltar para a pobreza. Mas esse número pode ser ainda maior, porque a suspensão de contratos vai acabar e pode ser que mais pessoas sejam demitidas. Então, 31 de dezembro vai ser o dividor de águas.

O pesquisador da FGV Daniel Duque, diretor de inteligência técnica do Centro de Liderança Pública, sugere que, mesmo que a renda da população cresça no próximo ano na mesma proporção que ocorreu entre junho e julho apenas com o trabalho, o fim do auxílio emergencial e o pagamento apenas do bolsa-família pode levar 9% da população para a extrema pobreza e parte da poupação voltando ao bolsa família, 9% da população seria inserida na extrema pobreza — percentual superior ao de antes da pandemia.

— Teríamos um acréscimo de 2% da população nesse grupo porque o mercado de trabalho está muito ruim. Isso geraria redução também nas receitas dos trabalhadores de pequenos comércios ou serviços. Isso porque, quando se aumenta o poder de compra da população mais pobre, eles acabam comprando de empreendedores individuais mais pobres também, que moram na mesma região. Vamos ter um efeito cumulativo — afirma o pesquisador.

Duque diz que estender o benefício emergencial em 2021 não é possível por causa do teto de gastos. Para tomar essa providência, o governo deveria cortar algum gasto a fim de migrar a verba para a população mais pobre.

— O dinheiro poderia vir dos penduricalhos nos salários de alguns servidores, do subsídio da cesta básica, do abono salarial dos trabalhadores formais. Existem alternativas, mas nenhuma é politicamente fácil de ser aprovada — considera: — Caso o presidente opte por dar alguma pedalada, o cenário externo vai ser ainda pior. O real pode se desvalorizar ainda mais, e os alimentos podem ficar mais caros, como já vem acontecendo.

Técnicos da equipe econômica acreditam que o auxílio emergencial acabou virando um Bolsa Família turbinado e, por isso, a intenção é unificar os programas sociais já existentes para criar um programa permanente de renda mínima. Por outro lado, o ministro da Economia Paulo Guedes ainda insiste em criar o programa Carteira Verde Amarela, mesmo com clima desfavorável no Congresso, o qual ajudaria na geração de empregos às custas de reduções dos benefícios.

Fonte: Extra